sábado, 28 de novembro de 2020

Franca, a forte influência mineira

As questões fronteiriças mundiais sempre são uma questão política, algumas resolvidas pacificamente, outras, infelizmente, de forma bélica. Há nisso algumas soluções mais simples, outras deram muito trabalho.


No artigo de hoje, da série que estamos fazendo no Verdade para comemorar o aniversário de Franca, vamos tratar da influência mineira na origem e formação de nossa cidade, vamos além do desenho geopolítico.


Tenho esta região mais ou menos como outras que, pela proximidade absoluta, as aspirações e gostos das populações que ali habitam são muito coincidentes, caso dos pampas, no extremo sul do Brasil, onde todo mundo é gaúcho, não importa se é brasileiro, uruguaio ou argentino. Por aqui, ser francano ou mineiro é uma casualidade, rss.


Em seguida fazemos um retrospecto de datas mencionadas nos artigos anteriores, isso deve nos ajudar a situarmos na linha do tempo na formação de Franca, leve por favor em consideração que algumas datas  ou referências são aproximadas:


  • 1698 - é descoberto ouro no rio das Velhas em Goiás, e em outras regiões próximas;
  • 1709 - os bandeirantes paulistas perdem a guerra com os emboabas (portugueses recém chegados), entre outros conflitos no território mineiro pelos lados de Ouro Preto;
  • 1720 - separação da Província de São Paulo e Minas do Ouro, nasce a de Minas Gerais, agora com nova denominação, isso complica ainda mais o trânsito pelo estado vizinho;
  • 1726 - criada nova rota pelos bandeirantes Anhanguera, contemplando mais o território paulista, com Franca no topo, em direção ao Rio Grande (veja no artigo anterior);
  • 1791 - na região de Covas (Miramontes) é fundada uma Companhia de Ordenanças pertencente à freguesia de Caconde e município de Moji Mirim e nomeado responsável o Capitão Manoel Almeida.
  • 1804 - vem para Franca, o "Belo Sertão do Rio Pardo”, uma pessoa fundamental - o mineiro de São João D’el Rei (Freguesia do Rio das Mortes), o capitão Hipólito Antônio Pinheiro, ele lidera um grupo de mineiros que ocupam toda a região, e dão os primeiros passos para a fundação do povoado;
  • 1805 - data de corte para esta fundação, em 29 de agosto é criada a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Franca e do Rio Pardo, aos poucos o nome se resume para Franca;
  • 1805 - em 03 de dezembro o arraial é assentado pelo capitão Hipólito em uma colina entre dois córregos: Bagres e Cubatão, em terrenos da Fazenda Santa Bárbara, doadas para este fim;
  • 1821 - Dom João VI cria a Vila Franca Del Rei, contudo a mesma não será instalada em virtude das ambições da Vila São Carlos de Jacui que desejava anexar essa região à Minas Gerais(1);
  • 1824 - Em 28 de novembro a Freguesia de Franca se emancipa de Moji Mirim, sob a denominação de Vila Franca do Imperador, já não havia mais ‘rei’ desde 1822, o Brasil estava independente de Portugal.


Então, se estamos falando em influência mineira, vimos que os conflitos com os mineradores na província de Minas Gerais (futuro estado) empurram os bandeirantes para cá no fim século XVIII, mineiros desmotivados com  fim dos garimpos em São João d'el Rei migram no início do século XIX para habitar esta região - liderados por Hipólito. Ele tenta dar oficialidade para o povoado, mas vizinhos mineiros queriam anexar esse território. Apesar não terem sucesso, atrasaram o processo de criação em três anos.


Nesse momento é preciso fazer uma divisão entre os primeiros moradores de Franca no início do século XIX (1800), entre as pessoas que vieram e ficaram por causa da estrada aberta pelos bandeirantes e os mineiros que migraram para cá liderados por Hipólito. 


Os pesquisadores fazem uma separação sócio-cultural, informam que inicialmente havia um certo gentio, cidadãos foragidos da lei de toda espécie, algo como quanto mais longe dos grandes centros melhor, e os migrantes mineiros já detentores de certa educação e espírito de família.


No livro “Franca…”,  do dr. Alfredo Palermo, já mencionado, são reproduzidas falas do prof. Carmelino Corrêa Júnior: “Franca foi arraial clandestino, mais tarde legalizado, sem que soubesse de onde surgiram seus primeiros apossadores de terra”, eram “perseguidos políticos e religiosos, campeando no bravio sertão o ouro e a paz de espírito”, afirmando que isso provocava um estado de violência. Em colonizações isso não foi novidade só aqui, claro, os EUA demonstram bem isso nos seus milhares de filmes (conflitos com gentios, índios, etc.).


Na mesma esteira dr. Alfredo menciona o pesquisador Estevão Leão Bourroul que, por causa dessa vinda de foragidos, “homens sobre cuja a cabeça pende flamejante o gládio da lei, então os criminosos, certos da impunidade, afluíam com mais desempenho”. Bourroul narra: “Houve rixas; o sangue correu por mais de uma vez, e por estas planícies sertanejas e encantadoras, ecoaram clamores bélicos”. (2)


Esse fato é corroborado pelo prof. José Chiachiri, o pai, entendendo que, sim os primeiros moradores tinham essa real fama, “porém a fundação dos arraiais não foi obra deles… Foram famílias inteiras que para cá se dirigiram e promoveram o povoamento”.  Chiachiri afirma com segurança: “A polidez dos mineiros tinha uma explicação, vinham da mais populosa capitania do Brasil”.


Então o povoamento da região era assim dividido, não necessariamente com regra única, enquanto subiam pela estrada em direção a Minas com os bandeirantes “mamelucos rudes, ignorantes e estúpidos”, como afirmara o já mencionado botânico francês Saint-Hilaire, e os mineiros que desceram de lá eram "polidos e educados”.


E aí damos um salto. Já vimos que, por volta de 1805, os mineiros liderados por Hipólito fundam o povoado e a Freguesia, as terras são arruadas e dois ilustres viajantes fazem menção ao que viram: Luiz de D'Alincourt, observou que "o arraial estava bem arruado, com ruas pouco povoadas, a exceção do Largo da Matriz que estava mais guarnecido de casas”, em 1818.


Já do outro, Saint-Hilaire, em 1819, transcrevemos na íntegra o contido no site da PMF do que ele testemunha:"O arraial de Franca, onde parei, fica situado num aprazível descampado, em meio a extensas pastagens alpicadas de tufos de árvores e cortadas por vales pouco profundos. O arraial ocupa o centro de um largo e arredondado, sendo banhado dos dois lados por um córrego. Não havia ali, à época de minha viagem, mais do que umas cinqüenta casas, mas já tinha sido demarcado o local para a construção de várias outras. Era fácil ver que Franca não tardaria a adquirir grande importância” (grifo nosso).


Com jeito e forma de uma minúscula cidade, a partir da fundação de 1805 até 1820, começam as tentativas da Freguesia em se tornar Vila, mas os mineiros daqui esbarram na tentativa de outros mineiros de lá, autoridades de Jacuí tentavam anexar esse território à sua jurisdição. Com a ascensão à Vila os francanos se livrariam dessa ameaça, mas também dos mencionados “gentios" com uma presença maior de força  policial, da lei e da justiça.(3)


Hipólito faz uma representação em 1809 ao Governo Provisório de 

São Paulo(estado), que tinha como titular o Capitão General Franca e Horta, e ele abraça essa causa como comprovam inúmeros documentos no museu da cidade. Só em 1821 é assinada a portaria, que só seria materializada em 1824,  em 28 de novembro, quando Franca se torna Vila.


Então, data vênia, os mineiros deram alma para o início da povoação francana e, mesmo os de Jacuí, leia-se também São Sebastião do Paraíso, que à época queriam se apossar de nossas terras, hoje são vizinhos, consortes, parentes, sócios e amigos, vivemos em uma região que foi sim motivada em uma divisão geopolítica, mas na atualidade tem um entrosamento fantástico de dois povos que se originam da mesma pátria e localidade tendo as mesmas aspirações, o que nos divide é uma linha imaginária.




(1) - Fonte dessa descrição e outros dados anotados nessa linha do tempo do site sobre história da Prefeitura Municipal de Franca.

(2) - 'ORIGENS DA FRANCA”, apontamentos históricos de Estevão Leão Bourroul, advogado, deputado por Franca, recortes encontram-se no Museu Histórico José Chiachiri.

(3) - Como não somos historiadores, em nossas pesquisas detectamos que a disputa por terras nessa época foi muito intensa entre paulistas e mineiros, os paulistas dominaram parte do Sul de Minas, então esse assunto vamos tratar sim, mas como calma.

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